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O direito à saúde na sociedade de austeridade

Clênio Jair Schulze

O presente texto tem por finalidade trazer a debate a relação entre: direito à saúde, sociedade de austeridade, gastos públicos e cortes orçamentários.

Crise é a palavra mais ouvida atualmente. E como justificativa da crise, o Estado – em especial o Poder Executivo – aproveita a oportunidade para realizar inúmeros cortes orçamentários na área da saúde.

Tudo isso acontece a partir de um grande rótulo: a sociedade de austeridade.

A sociedade de austeridade consiste em um “processo de implementação de políticas e de medidas econômicas que conduzem à disciplina, ao rigor e à contenção econômica, social e cultural” [1].

Por outras palavras, é o modelo estabelecido em vários países (em crise) e que impõe severas limitações ao exercício de direitos fundamentais – saúde, inclusive – como justificativa para superação da crise econômica.

A sociedade da austeridade possui ainda as seguintes características: (1) contenção de despesas estatais; (2) privatização; (3) aumento de tributos; (4) redução de salários [2].

Neste modelo, vende-se a ideia de que “não há alternativa” para solucionar a crise. E que apenas a restrição a direitos é que permite resolver o problema financeiro do Estado. E, ainda, tudo isso é feito em prol do bem comum de todos! [3].

Diante disso é possível fazer o seguinte questionamento: é possível, à luz do Estado Constitucional Democrático, permitir que neste cenário de crise econômica o alcance do direito à saúde seja limitado com base no argumento de austeridade? E, ainda, isso tudo vai permitir a manter a “saúde” das contas do Estado?

De início, a definição do orçamento é uma opção política. Isso não significa, contudo, que existe uma absoluta discricionariedade do Executivo e uma ilimitada liberdade de conformação do Legislador, porquanto é indispensável a preservação das determinações constitucionais, especialmente aquelas relativas aos direitos fundamentais.

De outro lado, a Constituição da República Federativa do Brasil não estabelece um rol de prioridades na definição da alocação de recursos.

A questão é importante, porque o chamado ajuste fiscal adotado pela União e, em geral, pelos demais entes da Federação, simplesmente reduziu linearmente todas as suas despesas, sem estabelecer uma ordem adequada de prioridade, limitando de forma sensível os repasses para a área da saúde. O Projeto de Lei do Orçamento de 2016 reduz as despesas em saúde.

Esta decisão política é correta? A resposta deve ser negativa.

Em primeiro lugar, porque a saúde tem prioridade. Estudo do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), denominado Sistema de Indicadores de Percepção Social (SIPS) – Nossos Brasis: prioridades da população, indicou que a melhoria dos serviços de saúde foi a opção escolhida por 87,64% dos entrevistados, figurando como primeira opção eleita [4].

Em segundo lugar, porque a redução do orçamento da saúde somente poderia acontecer após o corte de gastos em outras rubricas menos essenciais, o que não se verifica. Dois exemplos. É muito alta a verba pública gasta com publicidade. Apenas em 2013, o Governo Federal usou R$ 2,3 bilhões para veicular propaganda [5]. Em outro caso, o governo do Estado do Ceará pagou R$650 mil para a cantora de axé music Ivete Sangalo se apresentar na inauguração de um hospital! [6].

São dois exemplos que demonstram a baixa qualidade no gasto público. Assim, antes da saúde há vários outros cortes que os entes devem fazer, a fim de conferir eficiência e eficácia na alocação dos recursos públicos.

Em terceiro lugar, o direito à saúde também está protegido por inúmeras cláusulas constitucionais que asseguram, por exemplo, a vedação de retrocesso em saúde, a garantia do mínimo existencial em saúde e o dever de progresso em saúde.

A sociedade, portanto, não pode ser prejudicada pelas escolhas equivocadas do Executivo e do Legislativo e, principalmente, pelo subfinanciamento do SUS, pois isto não tem previsão constitucional.

Notas e Referências:

[1] FERREIRA, António Casimiro. A sociedade de austeridade: Poder, medo e direito do trabalho de exceção. Revista Crítica de Ciências Sociais, n. 95, 2011. disponível in: http://rccs.revues.org/4417
[2] FERREIRA, António Casimiro. A sociedade de austeridade: Poder, medo e direito do trabalho de exceção. Revista Crítica de Ciências Sociais, n. 95, 2011. disponível in: http://rccs.revues.org/4417
[3] FERREIRA, António Casimiro. A sociedade de austeridade: Poder, medo e direito do trabalho de exceção. Revista Crítica de Ciências Sociais, n. 95, 2011. disponível in: http://rccs.revues.org/4417
[4] Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). http://www.ipea.gov.br/portal/index.php?option=com_content&view=article&id=20859. Acessado em 25/11/2015
[5] Folha de São Paulo, 16/04/2014, Caderno Poder.
[6] Jornal Estado de São Paulo, 24/01/2013.

Clênio Jair Schulze

Juiz Federal do TRF-4. Doutorando e Mestre em Ciência Jurídica pela Universidade do Vale do Itajaí (Univali). Professor da Escola da Magistratura Federal de Santa Catarina (ESMAFESC) e da Escola da Magistratura do Estado de Santa Catarina (ESMESC). Professor da Escola da Magistratura do Trabalho de Santa Catarina (Amatra 12). Professor da Escola do Ministério Público de Santa Catarina. Juiz Federal na 4a Região, lotado na Subseção Judiciária de Brusque. Foi Juiz Auxiliar da Presidência do Conselho Nacional de Justiça, de 2013 a 2014.

Texto publicado em 30/11/2015.

Disponível no website Empório do Direito.

 

 

 

 

 

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